segunda-feira, 19 de abril de 2010

Sangue de Creutzfekdt Jakob tem poder

Essa semana eu foi doar sangue no Hospital Regional de Tefé.

A primeira etapa foi fazer a "Triagem Clínica do Doador", respondendo um questionário do HEMOAM (Fundação de Hematologia e Hemoterapia do Amazonas), com aquelas perguntas clássicas do tipo "Está alimentado?", "Fez tatuagem?", "Recebeu transfusão...?", e assim por diante.


O ítem 26 me deixou intrigado. Ei-lo exatamente como na ficha:

26) Doença de CREUTZFELDT JAKOB 
(Encefalopatia espongiforme humana e suas variantes) - Doença da VACA LOUCA
A) Tomou hormônio de crescimento de origem humana? (  ) Sim (  ) Não
B) Fez transplante de córnea?  (  ) Sim  (  ) Não
C) Permaneceu no Reino Unido ou na República da Irlanda por mais de seis meses de forma cumulativa após 1980?  (  ) Sim (  ) Não

 
(Retrato falado da "Vaca Louca")

Na hora eu fiquei muito confuso com a pergunta, pois além da moça que estava me entrevistando não conseguir ler a pergunta direito, eu fiquei tentando entender o que o Reino unido e a Irlanda após a década de 80 tinham a ver com a minha doação de sangue. Depois, já em casa, compreendi que a doença da vaca louca tinha mais incidência nestes locais...

Mas fiquei com pena de possíveis indivíduos que utilizaram hormônio de crescimento na mesma época que  fizeram transplante de córnea na Irlanda após terem passado férias no Reino Unido na década de 80. 
Eles jamais poderão doar sangue, coitados.

(Retrato falado do indivíduo que utilizou hormônio de crescimento e fez transplante de córnea na Irlanda na década de 80. Ele não deve doar sangue jamais.)


Se você quer saber mais sobre a doença de CREUTZFELDT JAKOB, visite o link: http://anatpat.unicamp.br/taneuprion.html


"O kuru, descrito em uma tribo na Nova Guiné, é uma forma de demência progressiva associada a ataxia e tremores (kuru, na língua indígena, significa tremor). Os nativos praticavam o canibalismo ritual, sendo a doença transmitida por este modo. O cérebro era particularmente apreciado e reservado às mulheres. A abolição do costume levou à virtual erradicação do kuru. As lesões lembram as da doença de Creutzfeldt-Jakob, com encefalopatia espongiforme predominando no cerebelo e formação de placas de amilóide no tecido nervoso."

O EREMITHA adverte: se você foi à Nova Guiné e comeu cérebro humano, por favor, não doe o seu sangue, ok? Eles não perguntam nada na triagem sobre a Nova Guiné e canibalismo. Um absurdo! ;-)

sexta-feira, 16 de abril de 2010

Demônios!

No último domingo eu estava de plantão. À noite estava lendo sobre um avanço na Classificação Internacional das Doenças (CID - 10), que rotula, sob o código F44.3, o chamado "Estado de Transe e de Possessão". Trata-se de um transtorno caracterizado por uma perda transitória da consciência da própria identidade pessoal quanto da consciência plena do ambiente. Devem ser incluídos nesse diagnóstico somente os estados de transe involuntários e não desejados, excluídos aqueles de situações admitidas no contexto cultural ou religioso do sujeito.


Ou seja: um indivíduo que ouça e veja os espíritos, ou que incorpore espíritos "voluntariamente", não é considerado doente, nem psicótico. E o mais interessante: um indivíduo que esteja sendo obsediado, que esteja "possuído" (como nos filmes "O exorcismo de Emily Rose" ou "O exorcista"), esses também não são considerados psicóticos, e sim com uma doença, um agravo de saúde, podendo ser classificado no CID-10 dentro deste espectro. Achei isso fantástico! Muito bom.
Lembremos que eu estava no meu plantão. Fui dormir. 5 da manhã fui acordado pelo enfermeiro para avaliar um rapaz que havia se cortado. Cheguei na sala de sutura, olhei o corte na perna, com uns 5 cm de largura e meio centímetro de profundidade. Perguntei:
- Rapaz! Como você fez isso aqui?
- Tenente, se eu te contar o senhor não vai acreditar.
- Conte! Garanto que vou!
- Eu moro com meus pais. Acordei gritando e me dei conta estava com o meu terçado (facão) na mão, a bainha na outra, ainda deitado na cama, e já estava com a perna cortada e sangrando! Foi obra do demônio que me possuiu! (Com a cara transfigurada de medo).
- Fica tranqüilo, o senhor vai levar uns pontinhos, coisa rápida!

Pedi para o enfermeiro limpar a ferida enquanto eu ia rapidamente ao banheiro lavar o rosto para acordar. Caminhei até o longo corredor do Posto Médico pensando na história do demônio. Quando eu coloquei o rosto no corredor levei um rasante de um morcego de um palmo e meio de comprimento! Recuei assustado, e o morcego continuou seu vôo até o fim do corredor, desaparecendo de minha vista ao fazer a curva na recepção. Em 8 meses neste posto, nunca havia visto um morcego entrar ali. Logo pensei: foi mesmo coisa do demônio! Por que? Bem...

Para identificar a presença de uma possessão, alguns ítens são observados. Um deles é a presença de animais sinistros ou insetos junto ao "candidato". 

Se acredito nisso? Parcialmente. Sou espírita e budista. Acredito na obsessão como a influência de espíritos vingativos, mal-feitores, obcecados, viciados... enfim, numa aproximação com intenções negativas e prejudiciais na maioria das vezes. Mas que fala de obsessão, possessão, encosto... está falando da mesma coisa, mas com explicações distintas para o fenômeno. Assim como a sua forma de resolução. O exorcismo católico, ou de outras religiões (em voga mais do que nunca, veja AQUI) não é efetivo, em meu ponto de vista, como é a ação de desobsessão. Esse assunto é complexo, e não pretendo esgotá-lo em um único post!

Um amigo me perguntou: mas como você explicaria o ocorrido sem envolver explicações sobrenaturais? Falei que estava apresentando fatos. dentre as explicações, o que dizer? Epilepsia? Surto psicótico? Ou o diagnóstico que existe no Código Internacional das Doenças utilizado no mundo todo: "estado de transe ou possessão"?

Mais vale o ensinamento de meu velho mestre de psiquiatria da UFF, quando o confrontei numa das primeiras aulas do curso sobre a origem das vozes ouvidas pelos psicóticos: "um bom psiquiatra dá o anti-psicótico e encaminha para um bom centro espírita!"



Crux sacra sit mihi lux 

Non draco sit mihi dux

Vade retro satanás
Nunquam suade mihi vana
Sunt mala quae libas
Ipse veneno bibas

quinta-feira, 15 de abril de 2010

De perto, ninguém é normal

Esta semana estão ocorrendo em todo o Brasil as Conferências Municipais de Saúde Mental, que levarão propostas para as Conferências Estaduais e depois para a Federal.

A reforma psiquiátrica continua em pleno vapor, e eu estou tendo a honra de participar como médico e representante do Exército na conferência da cidade de Tefé, que mesmo sendo interior do Amazonas e uma das cidades isoladas deste país, dá exemplo e possui um CAPS com equipe de saúde mental capacitada, trazendo o melhor do tratamento psiquiátrico, psicológico e demais ações intersetoriais que colocam em prática a integralidade, conceito fundamental do SUS.




OBS - Estou sumido do blog, mas ainda hoje prometo um post sobre possessão demoníaca! Até!

sexta-feira, 2 de abril de 2010

Botos


Quando cheguei na Amazônia, uma das coisas que mais me fascinou foi a aparição dos botos nos rios da região. Do nada, você está olhando para o rio, de repente aparecem um ou vários botos, e rapidamente afundam e somem. Pequeninos, grandes, cinzas ou rosas. O coração sempre bate mais forte, dá uma emoção bacana ver um boto, e fotografá-los é um desafio, pois quando você aperta a botão eles já afundaram.

Eu já consegui bater algumas fotos dos botos aqui por perto de Tefé. Eis uma delas com dois botos:


Acho que todos já ouviram falar de uma das lendas sobre os botos.
Uma delas diz que os botos transformam-se em homens e engravidam as mulheres. Depois voltam para o rio e nunca mais aparecem. Então, filhos de mães solteiras são possivelmente filhos do boto. De fato comentam essa história por aqui. O boto acaba sendo um ótimo álibi para as moças que engravidaram sem querer e não têm como justificar para as famílias o fato. Os antigos realmente acreditam nisso. Ouvi de uma paciente outro dia que a avó dela a proíbe de ir para a beira do rio sozinha para não ser "levada" pelo boto. Alguns relatos dizem que o boto, quando transformado em homem, se veste de branco e usa um chapéu para esconder aquela "barbatana". Cuidado com o boto, meninas.

Outra história que já escutei de diversas pessoas, diz respeito à diferença entre o boto cinza e o boto rosa. O cinza é menor, o rosa é grandão. Não sei falar nada sobre serem ou não de espécies (ou sei-lá-o-que) diferentes. Mas a história é sempre a mesma: os botos cinza são bonzinhos, salvam as pessoas que estão se afogando, ajudam os pescadores, nadam junto com as embarcações. Eu ouvi de um senhor, de uma espécie de tribo de índios na região das Missões aqui em Tefé, que uma criança da família dele, certa vez, sobreviveu ao cair de um barco pois um boto cinza o colocou no dorso e levou até a margem. Em compensação os botos rosas são maus, muito maus, e as pessoas têm verdadeiro ódio dos botos rosa. Dizem que eles derrubam as embarcações, e afogam as pessoas levando-as para o fundo do rio! Achei muita graça nisto, pois a Xuxa fez justamente uma música para os botos do mau: "boto rosa quem não sonha descobrir os seus segredos.... eô, eô, boto rosaaaa". Imaginem só... rs.

Mais uma: o aparelho genital, masculino e feminino, dos botos, seriam semelhantes aos dos humanos. Por este motivo, as botas estão sujeitas a estupros por partes de humanos zoófilos.

E outra: a carne dos botos não costuma ser comida. Dizem que ela é avermelhada e tem um cheiro muito forte, sendo portanto pouco apreciada para ingestão.


E para terminar: as mulheres que andam com um patuá que contenha em seu interior o órgão genital feminino de uma bota, torna-se irresistível para os homens. Os homens que andam com um dente de boto na carteira, tornam-se irresistíveis para as mulheres (ainda bem que é com um dente... rs). Ontem, acabei encontrando um hippie aqui em Tefé que me vendeu um dente de boto por 20 reais. Vamos ver se essa parte da lenda é realidade...!